Matheus Affonso contribui em matéria do Valor Econômico sobre sobre atuação do CARF – Leal Cotrim Advogados

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Matheus Affonso contribui em matéria do Valor Econômico sobre sobre atuação do CARF

Estatais e empresas de economia mista discutem mais de R$ 37 bilhões no Carf

União é parte de um passivo considerável em disputas em andamento no conselho

 

Enquanto busca elevar a arrecadação por meio do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), a União, do outro lado do balcão, é parte de um passivo considerável em disputas tributárias. Estatais e empresas de economia mista, como Petrobras, Banco do Brasil, BNDES, Infraero e Banco do Nordeste, discutem, no órgão, pelo menos R$ 37 bilhões em autuações fiscais.

Boa parte desse valor – cerca de R$ 35 bilhões – é da Petrobras. A empresa tem atualmente dez processos em tramitação no Carf, segundo informou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Em dois deles, que somam R$ 5,7 bilhões, saiu derrotada na semana passada. A companhia pretende recorrer ao Judiciário.

Os processos, analisados pela Câmara Superior – última instância do Carf -, tratam de tributação de lucros no exterior. No julgamento, foi aplicado o voto de qualidade, que voltou à cena por meio do pacote fiscal anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. É o voto de desempate proferido pelo presidente da turma julgadora, que é representante da Fazenda.

A volta dessa medida gerou protestos por parte dos contribuintes – que, até ali, levavam vantagem em caso de empate. O governo decidiu então negociar com o setor privado, o que levou o Carf a suspender os julgamentos desta semana à espera de uma solução negociada. Na pauta, constavam outros cinco casos da Petrobras.

Além da petrolífera, discutem autuações fiscais no Carf duas grandes empresas do setor público, o Banco do Brasil (BB) e o BNDES. Na semana passada, foi julgado um caso do BB, estimado em R$ 2,2 bilhões.

A primeira decisão do Carf foi parcialmente contrária ao pedido da instituição financeira, que ainda pode recorrer à Câmara Superior. O Banco do Brasil indica, em documento enviado à CVM, que a autuação fiscal trata de supostas diferenças de contribuição previdenciária patronal e de outras contribuições sociais sobre auxílio-alimentação e participação nos lucros e resultados (PLR) concedidos aos empregados em 2015.

O Banco do Brasil tem “vários” recursos administrativos submetidos ao Carf pendentes de julgamento, segundo informa em nota enviada ao Valor. Havia, inclusive, antes da suspensão dos julgamentos pelo Carf, outros processos em pauta, mas os valores não são conhecidos.

A instituição financeira, na nota, afirma que tem por conduta utilizar a via administrativa para discutir questões tributárias e que, após o esgotamento dessa fase, “em caso de decisão desfavorável, quando o banco entende que houve algum direito violado, leva a questão à apreciação do Poder Judiciário”.

O caso do BNDES trata da tributação de auxílio-alimentação pago aos empregados no ano de 2015. No processo, de R$ 12 milhões, a instituição financeira alega que o benefício pago por meio de tíquete não integra a base de cálculo das contribuições previdenciárias. A expectativa do banco é de resolver a questão no Carf, considerando parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que corrobora a sua tese.

O BNDES ainda informa, em nota, que contestações a respeito de controvérsias tributárias com a União seguem o tratamento das demais controvérsias jurídicas discutidas na esfera administrativa. Ou seja, em caso de discordância sobre eventual cobrança realizada pela Receita Federal (em valor ou cabimento), a área financeira do banco aciona a área jurídica para apresentar impugnação à Delegacia de Julgamento e, se necessário, recurso ao Carf.

“Após o esgotamento da esfera administrativa, as controvérsias tributárias do Sistema BNDES com a União podem ser levadas ao Poder Judiciário caso se vislumbre a possibilidade de ganho, seja pela existência de precedentes favoráveis ou pela razoabilidade de procedência da tese”, afirma o BNDES.

Há ainda um conjunto de ações envolvendo a Infraero no Carf. O principal assunto são operações nos terminais de carga de alguns aeroportos. São 177 ações ativas que tramitam na esfera administrativa, num total de R$ 52,4 milhões provisionados.

De acordo com a Infraero, não existe um procedimento diferenciado na atuação litigiosa contra a União. A empresa informa, em nota ao Valor, que, após a esfera administrativa, a Infraero faz a análise jurídica e econômica a respeito das chances de sucesso nas teses utilizadas no Judiciário para decidir sobre a judicialização ou pelo pagamento de eventual débito.

O Banco do Nordeste também tem discussões no Carf. Por nota, diz que não comenta assuntos relacionados a processos administrativos ou judiciais em curso. Apenas reafirma seu compromisso “com todas as regras de conformidade, compliance e melhores práticas de governança dos recursos públicos”.

De acordo com a procuradora-geral da Fazenda Nacional, Anelize Almeida, existe uma preocupação jurídica em diferenciar o Estado com poder de tributar da União acionista de uma sociedade de economia mista. “Não dá para misturar as coisas e dizer que vamos intervir na Petrobras. Não vamos, a Petrobras é uma pessoa jurídica de direito privado, tem os acionistas minoritários, privados. Há uma diferenciação em relação à União”, afirma.

A União, acrescenta, pode até conversar com empresas, como a Petrobras, sobre as autuações fiscais, mas da mesma forma que faria com outras privadas. A procuradora lembra que a Petrobras já fechou, no passado, um acordo (negócio jurídico processual) que vem sendo cumprido. “Se a empresa quiser fazer uma transação, se for uma demanda da empresa, é possível e vamos fazer da melhor forma possível”, diz.

Carlos Ari Sundfeld, docente da FGV Direito e sócio-fundador da Sundfeld Advogados, destaca que a governança é muito importante para que as decisões das empresas de economia mista de recorrer ou não em eventuais derrotas na esfera administrativa não venham a ser questionadas por minoritários ou mesmo pelo Ministério Público. De acordo com ele, deve-se verificar se estão seguindo padrões de diligência habituais nos mercados onde atuam.

“Há uma análise de risco”, diz o especialista, acrescentando que algumas empresas decidem com base em problemas de caixa, o que leva a estratégias diferentes. “Para quem olha de fora é difícil saber porque a empresa resolveu litigar ou não.”

O debate administrativo, segundo Matheus Affonso, do Leal Cotrim Advogados, existe na maioria dos países. “Índia, Bélgica e Itália, por exemplo, têm contencioso administrativo não só na primeira instância, que geralmente é um ente direto da administração tributária. Há também uma segunda fase”, afirma ele, destacando que nem todos adotam a composição paritária como o Brasil.

Ainda de acordo com o advogado, outros países também têm mecanismos como o da transação, para fazer acordos e negociar o pagamento de dívida tributária. “É do interesse da Fazenda e dos contribuintes que a cobrança se resolva com rapidez e certeza jurídica grande”, diz Affonso, lembrando que, no Brasil, não se cumpre a previsão de uma decisão administrativa no prazo de um ano.

 

Fonte: Valor Econômico

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01 de dezembro de 2020