Um dos motivos mais recorrentes para a formulação de pleitos de reequilíbrio econômico-financeiro à Administração Pública – especialmente nos contratos de obras públicas – é a variação extraordinária dos custos de insumos determinados.
Imagine-se, por exemplo, que, durante a execução de um contrato para a construção de uma plataforma de petróleo, tenha havido um forte e extraordinário aumento do preço do aço, que é um dos insumos mais importantes para este tipo de obra. Constatado o aumento extraordinário, com base no art. 65, II, “d”, da Lei de Licitações, o contratado poderia requerer à Administração Pública a correspondente revisão dos preços contratuais para que, com isso, ficasse preservado o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Uma questão prática que muitas vezes se coloca é, exatamente, como realizar esta revisão de preços. Mais especificamente: é necessário verificar se houve a redução do preço de mercado de outros insumos relevantes? Deve-se, ademais, compensar eventuais decréscimos de custos com o acréscimo pretendido?
Afinal, pode ocorrer que o aço tenha sofrido um acréscimo extraordinário, mas que outros insumos tenham sofrido pequenas (ou até grandes) reduções. O reequilíbrio econômico-financeiro pressupõe a consideração de todos os acréscimos e decréscimos?
Tradicionalmente, o Tribunal de Contas da União vinha defendendo a necessidade de um exame global dos preços dos itens contratados – ao menos dos mais representativos – para a revisão dos preços e restabelecimento do equilíbrio da equação econômico-financeira do contrato administrativo.
Nesse sentido, o Acórdão 1.680/2007-Plenário, da relatoria do Ministro Benjamin Zymler, de acordo com o qual vigora o “princípio de que o realinhamento deve ser do contrato como um todo, tanto dos itens que tiveram elevação dos preços, como dos que tiveram redução”.
O Acórdão nº 1.994/2009-Plenário, da relatoria do Ministro Augusto Nardes, também limitou a revisão de preços somente para “os itens contratuais que sofreram aumento de custo em relação ao índice de reajuste contratual e que não foram compensados por decréscimos eventualmente ocorridos em outros itens”.
Esse entendimento permaneceu sendo acolhido por precedentes mais recentes, como o Acórdão 1.466/2013-Plenário, em que a Ministra Ana Arraes observou que “eventual desequilíbrio econômico financeiro do contrato não pode ser constatado a partir da variação de preços de apenas um serviço ou insumo”, devendo ser “resultado de um exame global da avença, haja vista que outros itens podem ter passado por diminuições de preço”.
Em julho deste ano, contudo, esse posicionamento parece ter sido revisto. O Acórdão nº. 1.604/2015-Plenário, cujo relator foi o Ministro Augusto Nardes, analisou a Instrução de Serviço/DG 2, de 23/3/2015, do Departamento Nacional de Transportes – DNIT, que estabelece os critérios para o reequilíbrio econômico-financeiro de contratos administrativos em virtude da elevação dos preços de materiais betuminosos, diante da alta de preços anunciada pela Petrobras no final de 2014.
O questionamento da Unidade Técnica, naquele caso, se concentrava no fato de que o normativo não continha um procedimento de análise global e exauriente de cada contrato, a fim de verificar a existência de eventuais variações nos preços de outros insumos. Para os técnicos do TCU, em linha com o posicionamento até então manifestado pelo Tribunal, não seria possível promover o reequilíbrio econômico-financeiro de contrato administrativo apenas por meio da análise dos insumos betuminosos, porque ele não poderia se referir apenas à variação de um único insumo contratual.
O voto condutor do acórdão divergiu da instrução técnica, asseverando que a constatação do desequilíbrio da equação econômico-financeira do contrato administrativo em razão de variação imprevisível e extraordinária de preço “não requer que se considerem, como procedimento geral, todas as variações ordinárias nos preços dos insumos contratados – cobertos naturalmente pelos índices de reajustamento da avença -, mas apenas alterações de preços significativas e imprevisíveis (ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis), capazes de justificar a aplicação da teoria da imprevisão” (grifos nossos) e concluiu: “somente alguma outra constatação de natureza extraordinária e com potencial de impactar os contratos de forma significativa é que deveria ser computada, em conjunto com a reconhecida necessidade de recomposição dos preços dos materiais betuminosos, no cálculo do reequilíbrio econômico-financeiros dos contratos.”
De acordo com esse novo entendimento, portanto, somente outras variações também imprevisíveis e extraordinárias de preços poderiam ser compensadas com a variação que ensejou o pedido de revisão dos preços contratados. Consequentemente, uma análise global dos preços dos demais itens do contrato apenas será necessária caso haja indícios de que eles também sofreram variações com essas características.
Não se pode esquecer, todavia, que o reequilíbrio econômico-financeiro é, essencialmente, fruto de uma negociação entre as partes. Logo, não há impedimento legal a que a Administração Pública exija do contratado a compensação do acréscimo extraordinário de um insumo com eventuais decréscimos de outros, ainda que ordinários.
No entanto, a Administração Pública não estará obrigada a fazê-lo e, mais importante, os gestores públicos que conduzirem tais negociações não ficarão sujeitos à responsabilização pessoal perante o Tribunal de Contas da União se não procederem a um realinhamento geral do contrato (com a compensação dos decréscimos).
Como fica claro, o precedente reflete uma flexibilização do posicionamento que vinha sendo assumido por aquela Corte de Contas em inúmeros julgados que trataram do tema.