Por André Simão – 22.01.2018
De modo a possibilitar o pleno funcionamento dos gasodutos, os contratos de transporte de gás firmados pelas transportadoras preveem, em regra, a disponibilização de determinada quantidade de gás, pelo carregador, destinada a manter o balanceamento do duto, ou seja, a manutenção da pressão necessária para a movimentação das moléculas.
Esse volume de gás, usualmente denominado “empacotamento” ou “estoque de referência”, em regra, permanece sendo de propriedade do carregador, sendo entregue à transportadora apenas para viabilizar operacionalmente a prestação do serviço, durante a vigência do contrato de transporte. Ao final da prestação dos serviços, de acordo com regras usualmente adotadas no mercado, a quantidade de gás relativa ao empacotamento poderá ser adquirida pela transportadora ou vendida diretamente pelo carregador a terceiros.
Percebe-se, portanto, que essa quantidade de gás é de propriedade do carregador, o qual apenas transfere a sua custódia à transportadora. Ao final do contrato, ou haverá uma devolução deste bem ao seu proprietário ou poderá ocorrer a aquisição de sua propriedade, pelo preço de mercado. Não há, assim, nestes tipos de operação, qualquer ato que importe na transferência da propriedade desse gás enquanto na vigência do contrato.
Diante deste cenário contratual, uma correta compreensão da natureza jurídica das operações de recebimento e da devolução da quantidade de gás, recebida pelas transportadoras, para fins de “empacotamento” ou “estoque de referência”, nos termos dos contratos de prestação de serviços por elas celebrados, revela-se vital para a formalização de obrigações tributárias acessórias a estas inerentes.
Com efeito, uma primeira questão que precisa ficar bem clara, para a correta aplicação do direito no caso em tela, diz respeito ao caráter acidental da obrigação de custódia das transportadoras, no âmbito dos contratos de transporte celebrados com seus clientes.
Como a dinâmica dos negócios revela, não raro as partes de determinado negócio jurídico inserem, no âmbito de determinado contrato típico, obrigações próprias de outros modelos contratuais. Os exemplos são numerosos. Um contrato de compra e venda pode trazer consigo cláusulas de mandato, determinado negócio jurídico pode se materializar no sentido de uma parte prestar serviços em favor da outra em troca da oferta de comodato de determinado imóvel para habitação.
À luz desta realidade comercial, um dos temas mais tormentosos da doutrina civilista diz respeito à qualificação jurídica de contratos que carregam consigo aspectos de diferentes tipos de contratos ou mesmo elementos atípicos, usualmente, denominados de “contratos mistos”.
A teoria mais tradicional afirma que o conteúdo de determinado contrato é composto de três categorias de elementos: (i) elementos essenciais; (ii) elementos naturais, e (iii) elementos acidentais.[1] Assim sendo, a partir do exame destes elementos duas são as fórmulas usualmente encontradas pelos juristas para qualificar determinado contrato. Quando determinado contr