O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) avalia que o setor de petróleo e gás volta a ficar aquecido e a demandar plataformas e embarcações, cada vez mais eficientes do ponto de vista de combustíveis e do perfil de consumo energético. As projeções indicam cerca de 27 plataformas até 2031, o que vai requerer, ao menos, de 27 a 40 embarcações de apoio. O banco de fomento, principal agente financeiro do Fundo da Marinha Mercante (FMM), também observa que existem plataformas e embarcações em hibernação, além de potenciais oportunidades no setor de energia eólica offshore, que podem trazer algum tipo de demanda para a construção naval nos próximos anos.
A proposta de financiamento à reciclagem de embarcações leva em conta que o mercado doméstico tem 12% da frota com mais de 20 anos e que existem grandes consumidores de sucata que poderiam ter acesso, eventualmente, a linhas de incentivo ao sucateamento. A Agência Nacional do petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) estima aportes de R$ 51 bilhões no setor para descomissionar plataformas em cinco anos, o que poderia ser positivo para o Brasil e trazer novas demandas para os estaleiros locais.
“Verificamos que o setor naval está passando por uma fase de transição e ajustes, com estaleiros adequando capacidades e quantitativos de empregados. Por outro lado, empresas que sofreram bastante com taxas de afretamento estão ajustando suas frotas”, disse a chefe do departamento de gás, petróleo e navegação do BNDES, Elisa Lage, nesta terça-feira (25), durante audiência pública sobre o crescimento da indústria naval brasileira na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, que foi solicitada pelo deputado Jorge Solla (PT-BA).
A partir de 2014, houve redução grande nos preços do petróleo, que bateram o patamar de US$ 40/barril, depois caíram para quase US$ 20/barril, puxando para baixo as taxas de afretamento a nível mundial. No Brasil, o BNDES enxerga resiliência maior das tarifas por conta dos contratos de afretamento de longo prazo firmados com a Petrobras na época. Atualmente, o banco já observa um movimento de retomada das tarifas de afretamento, reflexo do barril do petróleo na faixa de US$ 80.
Elisa lembrou que, entre 2000 e 2014, houve crescimento das atividades dos estaleiros enquanto a indústria estava aquecida e havia bastante demanda por construção. Neste período, a construção naval atingiu o ápice de quase 82.500 empregos, que foi sucedido por uma redução drástica do número de empregos. Desde então, os estaleiros vêm mantendo quantidade de empregos suficiente para realização de manutenções e docagens, com volumes bem menores de mão de obra.
Desde 1999, o BNDES apoiou 135 embarcações de apoio offshore, 20 petroleiros, além de uma série de docagens e modernizações, especialmente as de apoio offshore. O banco também foi agente de financiamento de recursos do FMM para a revitalização de cinco estaleiros e da implantação de outras três instalações novas com esta finalidade de 1999 a 2022. Entre 2000 e 2022, os desembolsos via BNDES para o setor naval e de O&G somam R$ 25,7 bilhões e abrangem principalmente petroleiros, embarcações de apoio, estaleiros e docagens. A partir de 2019, os recursos se concentraram principalmente em barcos de apoio offshore e em docagens.
“Notamos que 2015 foi o ápice de desembolsos. Foi um período de muitas entregas de projetos. Houve desaceleração dos desembolsos, na medida em que os contratos de financiamento foram diminuindo em função da redução das encomendas. A queda mais aguda ocorreu a partir de 2020, com contratos mais voltados à modernização e à docagem de embarcações, com volumes menores comparados à construção de embarcações”, analisou.
Para a chefe de departamento do BNDES, o setor de O&G foi o que inicialmente proporcionou a retomada da construção naval na virada da década de 1990 para os anos 2000, com um cenário que reuniu fatores como crédito de longo prazo do FMM, arcabouço regulatório favorável à bandeira nacional (circularização) e empreendedores dispostos a investir.
Elisa, que também é conselheira suplente do BNDES no conselho diretor do fundo setorial (CDFMM), contou que o grupo vem debatendo e identificando novas oportunidades de negócios relacionadas ao setor naval, inclusive com ações com foco em ESG (boas práticas de governança e socioambientais, em tradução livre) que podem ser apoiadas pelo FMM.
O CDFMM discute se deve seguir com financiamento à construção ou modernização de embarcações mais eficientes. De acordo com a conselheira, as empresas vêm demandando menor consumo de energia e embarcações com redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE), o que abre espaço para pesquisa e desenvolvimento (P&D) em tecnologia para o país e pode trazer impacto positivo para o meio ambiente. Na mesma direção, caminham as discussões sobre financiamento à reciclagem de embarcações de forma ambientalmente correta.
Elisa mencionou que o financiamento ao descomissionamento e desmantelamento de plataformas pode ser um caminho para o descarte de forma ambientalmente adequada de resíduos perigosos e de bioincrustação, como o coral-sol. A reciclagem do aço, por exemplo, traria uma visão de economia circular. “Na questão do descomissionamento e desmantelamento de plataformas, seria positivo que fosse realmente feito no Brasil. Traria uma demanda para o setor e para os estaleiros. Seria bastante relevante”, comentou.
O secretário-executivo do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), Sérgio Leal, acrescentou que tramita na Comissão de Viação e Transportes (CVT) da Câmara dos Deputados o projeto de lei do deputado Coronel Armando (PSL-SC) que trata da reciclagem e das atividades de descomissionamento, desmonte e desmantelamento de embarcações. “O PL 1.584/2021 é importante e acompanhamos de perto. Já foram colocadas emendas. É preciso regulamentar o descomissionamento e esses itens ‘abandonados’. Esse assunto interessa bastante ao Sinaval e acompanhamos com muita atenção”, salientou.
O CDFMM também vem olhando para o financiamento aos gastos locais para aquisição, construção e integração de módulos de plataformas, bem como o financiamento à construção e integração de estruturas flutuantes para a geração de energia offshore. A avaliação, segundo Elisa, é que o setor de O&G já detém o conhecimento da operação marítima, ao passo que estaleiros e armadores começaram a se preparar para atender a esse novo mercado. “Já ouvimos de empresas sobre esse interesse e existem empresas aprofundando estudos para esse novo mercado que pode surgir puxado pelas petroleiras”, destacou a conselheira do BNDES no conselho.
Fonte: Portos e Navios