Reprodução na íntegra da matéria publicada na revista Portos e Navios com participação do nosso advogado Matheus Affonso:
Restrições do Repetro-Sped não devem se estender a afretamentos a tempo, diz advogado
Analistas avaliam que uma negativa recente à concessão do benefício fiscal gerou insegurança jurídica quanto à limitação que deveria ser aplicada somente em afretamentos a casco nu
A Receita Federal (RFB) negou recentemente o Repetro-Sped para a importação de um navio sonda pela Petrobras. Para alguns analistas, a recusa à concessão do benefício fiscal está associada a uma nova interpretação pela fiscalização da RFB, supostamente em razão de alterações pontuais no Manual do Repetro. A avaliação é que a decisão gerou insegurança jurídica no setor de petróleo e gás, pela possibilidade de entendimento de que a RFB teria estendido, também para afretamentos por tempo, uma limitação que a instrução normativa (IN/RFB 1.781/2017) estabelece especificamente para afretamentos a casco nu.
Essa IN pontuou que, na hipótese de haver um afretamento a casco nu e a execução simultânea de serviços, a importação da embarcação deve ser feita pela tomadora do serviço (operadora), caso conste nos contratos que ela é a responsável pelo pagamento da locação internacional. O advogado Matheus Affonso entende que tal restrição guarda fundamento no Regulamento Aduaneiro, pois, para fins de admissão temporária para utilização econômica, uma empresa pode importar bens para a prestação de serviços, mas não para uma simples locação nacional. “Essa restrição diz respeito tão somente a afretamento a casco nu, e não se aplica ao afretamento por tempo”, frisou Affonso, do escritório Leal Cotrim Advogados.
Affonso considera que a Receita agora está ampliando essa restrição, ainda que sem qualquer suporte na IN ou no Regulamento Aduaneiro, também para afretamentos por tempo. No entanto, ele acredita que essas alterações não são capazes de, por si só, reduzir o alcance do Repetro nos casos de afretamento por tempo, enxertando-lhe como condição importação direta pela empresa que paga as contraprestações. “É bastante claro que a limitação cogitada, em relação aos casos de afretamento por tempo, não tem respaldo legal e não é compatível com o Repetro”, analisou.
O advogado explicou que a brecha para a nova interpretação, que vem causando insegurança jurídica no setor, é a supressão do parágrafo do Manual do Repetro que atesta que “o contrato de afretamento a casco nu é um contrato de importação” e que “o contrato de afretamento por tempo é um contrato complexo composto tanto de contrato de importação quanto de contrato de prestação de serviços”, no tópico relativo ao contrato de afretamento, nos procedimentos para concessão do Repetro temporário.
Para Affonso, uma decisão como essa, ainda que singular e passível de retificação, acende um alerta para o setor de O&G, principalmente por conta da grave insegurança jurídica e da ameaça de oneração dos investimentos na fase de maior incerteza. O advogado observa que, até o momento, esse é o único caso do qual se tem ciência de que a RFB adotou tal entendimento restritivo. “Como ele teve fundamento em uma alteração de texto do Manual do Repetro desprovido de efeito vinculante, espera-se que represente apenas um entendimento equivocado único e não inaugure uma série de decisões similares”, comentou Affonso à Portos e Navios.
O Repetro diz respeito à desoneração de tributos na etapa inicial de pesquisa, exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural, permitindo maior atratividade para investimentos de capital intensivo e elevado risco. Affonso explicou que é justamente a desoneração do Repetro que viabiliza a decisão pelo investimento num cenário de competição internacional. Dessa maneira, a perda de atratividade poderia acarretar migração do investimento para a exploração de óleo em outro país e, no contexto da transição energética, muito provavelmente, a não-exploração futura das reservas existentes.
O advogado avalia que a continuação de cenário de oneração da importação de embarcações afretadas por tempo vai acabar gerando um impacto imediato às operações de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural, o que impactaria diretamente no preço final do serviço. Haverá também, segundo Affonso, um efeito gerado pela possível judicialização dessa discussão e a profusão de ações discutindo esse tema. Ele mencionou ainda a possibilidade de atraso na finalização do desembaraço aduaneiro, o que afetaria sensivelmente os cronogramas de operação.
O regime especial é voltado para suspensão, com posterior isenção ou alíquota zero, dos tributos sobre o consumo, quais sejam, Imposto de Importação, Imposto sobre Produtos Industrializados, contribuições do Pis e da Cofins, contribuições do Pis-Importação e da Cofins-importação, com reflexo sobre ICMS, nas atividades de importação definitiva ou temporária de bens, ou de aquisição nacional de bens aqui industrializados, destinados às atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural.